Saturday, October 24, 2009

"O PAI
Era perversa:
dormia toda nua, os peitos soltos e brandos muito brancos e expostos tal como os seus mamilos largos, róseos, distendidos.Durante o dia andava em casa com as blusas desabotoadas e sentava-se de qualquer maneira com os fatos a subirem-lhe sempre a meio das coxas, deixando antever entre as pernas uma escuridão macia, amolentada na sua meia penumbra.

Era perversa:
deitava-se nos sofás, ao comprido, os braços atirados para trás e ficava assim, toda lisa, ao seu alcance, sem mal, a passar a língua aguda pelos lábios já húmidos

Era perversa:
de um louro fundo, a pele penugenta, os olhos de um azul duro, sempre adormentados

Era perversa:
rodeava-lhe com os braços o pescoço, os seios a esmagarem-se-lhe de encontro ao peito e o hálito morno, sedoso, a roçar-lhe a noca, a rastejar-lhe perto, como qe entorpecido de saliva.

Era perversa:
Deixava a porta entreaberta, esquecida, enquanto se despia devagar, a descobrir o ventre brando, os ombros magros, devagar em breves movimentos, em secretos sons e pactos com a infância.

Era perversa:
trazia os cabelos em desalinho e mornos de sono quando o beijava de manhã, a dar-lhe os bons-dias, com uma distracção de hábito tomada.

Era perversa:
dormia toda nua, os peitos soltos e brandos muito brancos e expostos tal como os seus mamilos largos, róseos, distendidos.

Quando entrou no quarto o homem hesitou, a olhá-la, a fixá-la no seu sono, mas logo avança, silencioso, e de manso pára junto à cama a hesitar novamente. Depois estende uma das mãos, desliza-a na curva suave do peito, na anca quente, doce, o dedos crispados a entranharem-se já nos pêlos sedosos da púbis.Curva-se quando ela acorda e tapa-lhe a boca com força, brutal, mantendo-a deitada, firmemente, debaixo do seu corpo agora ao comprido sobre o dela.Era perversa:tinha um riso liberto, sedento, e uma maneita envolvente de olhar os outros; um odor enlouquecido a entreabrir-se aos poucos, como um fruto, obsessivo: obsessivamente, obsessivamente.Indiferente, Mariana sente que ele sai de dentro de si, sujando-a de esperma também por fora. Depois vê-o que se levanta da cama, se veste à pressa e se vai embora sem a olhar, todo o tempo mudo, mesmo enquanto a forçara, mudo mesmo quando a tivera, rendida, afundada naquele torpor, de onde não quer sair nunca mais, cada hora mais fundamente perdida.«- Tens de deixar esta casa - disse-lhe ele numa voz neutra, monocórdica - não podemos continuar a viver todos juntos na mesma casa depois do que se passou. Foste a culpada de tudo, bem sabes que foste a culpada de tudo, eu sou homem; sou homem e tu és provocante, perversa. és perversa. Uma mlher sem vergonha, sem pudor. Não te quero ver mais, enojas-me, repugnas-me, envergonhas-me. Tu percebias, sei que percebias, que sabias como me punhas. Eu sou homem minha puta.»

- Claro que sou uma puta, podes estar tranquilo, pai, sou uma puta.

«- Grande cabra - chamou-lhe a mãe quando ela se dirigia para a porta da rua, agarrada às paredes para não cair. - Grande cabra.»"

23/4/71 in Novas Cartas Portuguesas

Friday, October 16, 2009

Quem disse que era fácil?

Da última vez que fiz uma análise à minha vida estava a pensar fazer um mestrado, tudo corria lindamente... E agora, não corre lindamente, mas vai correndo bem.
Dividir o tempo entre, aulas de alemão (não consegui acabar a licenciatura), seminários de mestrado (aprendi que não sou uma pessoa que desista fácilmente e que não vai abaixo por qualquer coisa), o trabalho de fim-de-semana na Zara (sim, é triste de todas as propostas e empregos que podia ter, fiquei com o que menos glamour e remuneração tem... Adeus Porto Palácio, adeus externato, adeus Caetano Bus, por agora). E depois a vida de pessoa, que embora sendo pouca ainda vai dando para estar com alguns amigos, sentir muito a falta de outros que estou longe longe ou que mesmo pertinho fazem as saudades apertar.
Não pensem que me queixo (ok, por vezes vem uma fraqueza momentanea e eu começo a dizer porque raio me meti nisto tudo ao mesmo tempo). Fui eu que escolhi estar assim cheia de trabalho até à ponta dos cabelos (ora lê romances com imensas páginas para Literatura Norte-Americana, ora lê peças de teatro para Literatura Inglesa, ora lê poéticas para Crítica Literária, ora lê textos para Estudos Feministas, ora prepara textos para História do Género ou tenta não fulminar a professora de alemão com os olhos)... No meio disto tudo já são horas e horas perdidas de sono para tentar fazer tudo, é ler enquanto se janta... É lista de coisas a fazer que nunca mais acaba...
É não ver TV ou filmes há mais de um mês e meio... É estar por vezes tão cansada que parece que nunca mais acaba...
E no fundo, estou feliz por isso. Sinto que estou no sítio certo. Sinto que não poderia estar a fazer mais nada que não isto...
Que me desculpem os meus amigos se ultimamente tenho estado um bocadinho ausente, distante, chata e a cair de sono...
Isto de se tentar conciliar tudo não é nada fácil... Mas quem disse que era?

Saturday, October 10, 2009

O ... não mata, mas morre!