Fui um dos muitos portugueses que só conheceu "As Novas Cartas Portuguesas" numa aula com Ana Luísa Amaral. Estava no meu primeiro ano de mestrado. Os estudos de género, queer e feminista já estavam mais entranhados na minha pele mais do que alguma vez achei possível.
Passei o meu último ano de licenciatura a fazer trabalhos, apresentações e a refletir sobre as mulheres, os seus papéis, e sobre o género em geral.
Foi na primeira aula de estudos feministas que me entregou o texto. E lembro-me como se fosse hoje: Era uma folha de papel dobrada quase no final para não vermos como acabava o texto. Entregou-nos e disse "leiam, leiam com atenção. Isto é um exercício que gosto de fazer com os meus alunos de introdução aos estudos feministas. O texto fala de um corpo masculino ou feminino? O texto foi escrito por um homem ou por uma mulher?". E com estas interrogações em mente comecei a ler o texto. Confesso que foi bastante ambíguo e que fiquei bastante confusa, era esse o objectivo do exercício.
Respondi que era um corpo de homem. E que tinha sido escrito por uma mulher. "Mas porque?" saltou a pergunta. Dei algumas razões, todas heteronormativas e genderizadas...
Quando dobramos a folha era realmente o corpo de um homem e havia sido escrito por mulheres.
Foi o meu primeiro contacto com as "Novas Cartas Portuguesas".
Já tinha lido e ouvido falar das "Cartas Portuguesas, mas estas tornavam-se um mistério para mim, um mistério que queria decifrar. E assim o fiz.
Fiquei quase louca com este livro! Foram meses e meses à procura deste livro em livrarias. Em todas elas a mesma resposta, não temos. Foi correr bibliotecas onde finalmente o encontrei e devorei página a página.
Mas havia algo de errado. Aquele livro não era realmente meu.
Então, num natal, foi essa a minha prenda. A edição com notas com a colaboração de Ana Luísa Amaral.
Nunca mais larguei o livro e nunca mais larguei o género que para mim é a área de estudo que mais me fascina.
Mais tarde tive a oportunidade de conhecer umas das 3 Marias. Maria Teresa Horta. Foi das pessoas mais acessíveis que encontrei em toda a minha vida. É aquilo que se vê. Frontal, meiga, que acredita no que acredita e sempre com um sorriso.
E nunca consegui decifrar, se a escrita é masculina ou feminina... Cá para mim, isso não existe...
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